LIBERDADE DO VENTO
Ela foi abandonada pelo marido, quando disse que estava grávida de gêmeos. Ele pediu que ela abortasse, seria uma despesa muito grande sustentar quatro pessoas e todas as despesas que duas crianças iriam provocar. Ela se preparou para receber os filhos da melhor maneira possível, trabalhou até a última semana da gravidez. As crianças nasceram sadias e lindas. Contou com a ajuda da mãe, da avó e de alguns amigos que se revezavam nos cuidados dela e das crianças. Logo que foi possível voltou ao trabalho. Terminou a faculdade de Direito e passou a trabalhar, ainda mais, no escritório de advocacia onde atuava como estagiária. Assumiu diversos casos e era a estrela das causas ganhas. Era procurada por empresários, artistas e diversas pessoas que queriam sua atuação em casos judiciais. Passou a ganhar muito dinheiro. Contratou babá para os filhos, comprou uma casa nova e procurava manter uma ótima qualidade de vida para todos. As crianças cresciam saudáveis e felizes. Sempre que chegava em casa, independente do horário, ia ver os filhos. Cobria-os, cantava canções de ninar e, mesmo que já estivessem dormindo e ela muito cansada, não abria mão desse contato. No entanto, dificilmente podia participar das reuniões da escola, das competições de natação e das apresentações do balé. Nos finais de semana e feriados proporcionava passeios, ou convidava as crianças para brincarem no quintal, para pescarem no lago, mas eles preferiam ficar em frente a televisão ou jogando no celular ou computador. Os gêmeos tinham tudo o que queriam, estudavam nos melhores colégios, frequentavam clubes de recreação e, quando atingiram a idade, cada um ganhou o carro que queria. Ela queria passar mais tempo com eles, no entanto eles tinham seus amigos e não queriam ficar com “a velha”. A menina foi fazer faculdade de medicina e o menino optou pela profissão da mãe. Ela pagou a faculdade as despesas de formatura e quando os filhos já estavam trabalhando e bem encaminhados resolveu se aposentar. Estava precisando de um descanso, o tempo lhe havia imposto sucesso e cansaço. Ela pensou que agora que os filhos já tinham suas estradas abertas e já os tinha ensinado a caminhar eles poderiam voar e ela poderia estacionar. Avisou a eles que estava decidida a encerrar sua carreira. Foi quando começou o seu inferno. O pai das crianças apareceu, estava falido e queria sua parte nos bens que ela havia conquistado. Os filhos não aceitavam o fato de ela não querer mais trabalhar e, assim, não mais lhes financiar os caprichos. A alegação do pai era que, como eram casados, ele tinha os seus direitos, a alegação dos filhos era que ela sempre fora uma MAE ausente, que lhes faltou carinho e dedicação. Ela fez um levantamento de toda sua trajetória. Quem lhe deu atenção? Quem lhe ofereceu carinho e colo quando ela derramou lágrimas e lágrimas sozinha no quarto? Ela não era vítima, muito menos carrasco! Não iria ficar lamentando, a vida era boa demais para lamentações! Em alguns meses o ex-marido e os filhos receberam, cada um, um envelope. Ela havia feito um testamento, um advogado os manteria a par de suas decisões. Trocou de telefone, arrumou suas malas e entrou em um avião particular. Sua carreira de advogada se encerrara. Seu papel de mãe não foi sucesso, não obteve aplausos, a cortina se fechou e o silencio se fez. Ela estava satisfeita com tudo o que tinha feito. Sabia que tinha dado o seu melhor embora esse melhor não tenha agradado a todos. Suas malas estavam vazias de ressentimentos, de arrependimentos... Carregavam apenas a liberdade do vento. Desembarcou em uma pequena ilha e foi andar descalça pela areia... Ione da Silva Grillo
Enviado por Ilda Maria Costa Brasil em 01/02/2024
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