Ilda Maria Costa Brasil, Celeiro da Alma

"Sonhar é acordar-se para dentro." Mario Quintana

Textos



PITANGA, A COR DO SABOR E DA VIDA.

Sempre que transito na Rua São Francisco, recordo da minha infância e de uma pessoa que muito apreciei e que não mais está no mundo terreno: Cristiane von Saltiél, pois passo embaixo de uma majestosa pitangueira. Ambos, com muito lirismo e subjetividade, escreveram sobre vivências infantis onde as pitangas tiveram um papel singular. A Cris, em seu poema, pinta imagens belíssimas de um grupo comendo pitangas no campo, dando-lhes vida, magia e beleza.
Infância... Pés de pitangueiras eram comuns nos campos de meu avô paterno. Havia árvores de diversos tamanhos. Algumas, pequenas; outras, segundo vovô, em torno de 2 a 4m de altura. Para mim, as suas folhas e flores tinham aroma agradável de festa. Eu adorava esmagar o fruto maduro entre as mãos e comê-lo, vagarosamente, a fim de saborear aquela massa deliciosa, doce e perfumada de tom vermelho. Na época de colheita, pela manhã e no fim da tarde, percorríamos as pitangueiras para colhermos os frutos. Esses tinham que ser apanhados com cuidado e muita habilidade, pois, quando maduros, são frágeis e os dedos que os apanhavam eram gulosos e devoradores. Eu e minhas primas acreditávamos que, se comêssemos o fruto bem madurinho, ficaríamos com os lábios vermelhos, tal qual batom.
Lembro-me de que torrávamos a paciência de vovô perguntando sobre o período em que o fruto estaria maduro. Ele nos explicava, calmamente, que era preciso esperar o retorno das aulas: março e agosto, pois “a danada da plantinha, para agradar a meninada, dá frutos duas vezes no ano”. Essas palavras eram sempre acompanhadas de um largo sorriso e muito brilho nos seus lindos olhos azuis. Nós as consumíamos ao natural (normalmente, sem lavá-las), em forma de geleia, sorvete, compotas e sucos e, aos adultos, acrescentavam deliciosos vinhos, licores e caipirinha. Quando retornávamos para casa, a roupa estava tomada de manchas vermelhas; não esquentávamos com as broncas que ouvíamos, já que alma e estômago estavam forrados de encarnado, a cor do sabor e da vida, a cor da pitanga.
Nem tudo era alegria, em certas ocasiões, davam-nos chá de pitangueira. Desse, eu não gostava e ficava pensando o porquê dos adultos destruírem, dessa forma, a beleza dessa plantinha tão mágica e fascinante. Na minha opinião, era um gesto cruel e horrível “dos grandes”.
Até hoje, ao passar próximo a uma pitangueira, o seu perfume doce e aromatizado me faz sentir criança.



 
Ilda Maria Costa Brasil
Enviado por Ilda Maria Costa Brasil em 25/05/2013
Alterado em 09/01/2014
Copyright © 2013. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.


Comentários

Tela de Claude Monet
Site do Escritor criado por Recanto das Letras