MISCIGENAÇÃO: ÍNDIOS X ITALIANOS! No século XIX, chegaram os primeiros imigrantes italianos ao Rio Grande do Sul. A maior parte deles se fixou na serra; os demais espalharam-se pelo Estado. Os avós de Miguel radicalizaram-se em Cachoeira do Sul. Alguns anos depois, o casal teve o seu primeiro filho, Ângelo. Esse jovem, embora educado dentro dos costumes rígidos de suas raízes, não se interessava por moças de pele clara que nem ele. As morenas lhe chamavam mais a atenção. Seu pai, próspero plantador de trigo e proprietário de um engenho, adquiriu um caminhãozinho para que o rapaz transportasse o produto a ser comercializado em Santa Maria. Nessas idas e voltas, percebeu que, nas proximidades do Rio Jacuí, onde a travessia era feita por balsa, havia uma aldeia indígena. Freqüentemente, via-se olhando com encanto e admiração as mulheres da aldeia. Certo dia, sua mãe pediu-lhe que comprasse uns cestos de vime e, ele, finalmente, teve um bom motivo para se aproximar dos índios. Estacionou o caminhão à beira da estrada e, à medida que se aproximava do grupo, observou que as meninas e as mulheres baixavam os olhos e inclinavam, levemente, a cabeça. Considerou o gesto como um dos costumes feminino. Enquanto escolhia os produtos, chegou uma jovem belíssima, trazendo um cesto com flores campestres e ervas medicinais. Seus cabelos eram longos e negros como o ébano. Os olhos, um pouco puxadinhos e, também, negros, apresentavam um brilho fascinante e encantador. O rosto, levemente arredondado, era delicado e atraente. O corpo, com as formas bem definidas, demonstrava extrema sensualidade. Era tudo muito perfeito! Uma deusa! A menina, ao vê-lo, repetiu o gesto das outras mulheres; contudo, nesse havia muita sensibilidade e poesia. Em seguida, afastou-se suavemente. Parecia flutuar! Seus movimentos eram harmônicos e melódicos! O rapaz sentiu um intenso arrepio passar-lhe pelo corpo e ruborizou. Rapidamente, pagou as compras e continuou a viagem. Três dias depois, quando retornava à Cachoeira do Sul, precisou aguardar a balsa que estava no outro lado do rio. Enquanto esperava, passou a andar à sua margem. Nisso, viu a jovem que passara a ocupar seus pensamentos e foi tomado de imensa alegria. Aproximou-se e a cumprimentou. Ela levantou os olhos, sorriu e deu continuidade ao seu trabalho. Ele a observou por longo tempo e desejou que a balsa demorasse muito para alcançar a margem onde se encontrava; sentia-se enfeitiçado. Ao despedir-se, notou que os olhos da indiazinha brilhavam como pedras preciosas. Neles havia mistério, fraternidade e doçura. A partir desse encontro, durante os dias e as noites, via-se pensando na menina. Um dia, encheu-se de coragem e a pediu em namoro. Tainá, então, informou-lhe que sua família não a queria ver conversando com homens brancos, pois esses não respeitavam as mulheres indígenas e nem as queriam para esposas. Enquanto falava, suas palavras transpareciam mágoa, tristeza e desencanto. Ao perceber seu sofrimento, desejou abraçá-la, mas não o fez, receando não ser bem interpretado. Por precaução, limitou-se a lhe explicar que estava apaixonado e a desejava para ser sua esposa e mãe de seus filhos. Por um instante, acreditou ver naqueles olhinhos negros, cheios de lágrimas, um pequeno brilho. Ângelo tentou expor suas intenções à família de Tainá, porém não quiseram ouvir-lhe. Entre viagens e encontros, o sentimento que os unia, foi se fortalecendo e, um dia, sem o conhecimento dos pais, a jovem foi levada pelo rapaz para Cachoeira do Sul. Numa cerimônia simples, Ângelo e Tainá casaram-se. Transcorridos alguns meses, tentaram se aproximar dos familiares; mas não foram aceitos. Esse distanciamento, no início, deixou-lhes tristes e lhes causou muito sofrimento; todavia, aos poucos, passaram a aceitá-lo. Cada um procurou assimilar a diversidade do outro com respeito e com dedicação. E, nesse clima de troca, ocorreram grandiosas e fantásticas experiências. Um ano depois, nasceu o primeiro filho do casal. Dessa miscigenação, um belíssimo resultado! O bebê tinha a pele morena, os olhos azuis e os cabelos negros e lisos. Vicente cresceu forte e robusto e, uma semana antes de completar seus três aninhos, seus pais, Ângelo e Tainá, viajaram a São Pedro do Sul e, ao passarem pela aldeia indígena, acenaram ao grupo. Uma só mão retribui-lhes o gesto. Ficaram alegres e decidiram que, na volta, chegariam. E, assim fizeram! De início, foram praticamente ignorados mas, no momento em que o menino começou a correr entre eles e abraçá-los, o gelo foi se rompendo. Sorrisos e olhares fraternos e brilhantes passaram a ser vistos. Muitos abraços e carinhos foram trocados. Antes de partirem, Ângelo e Tainá decidiram festejar o aniversário de Vicente na companhia dos avós maternos. A partir desse dia, o desenvolvimento do menino - inteligência, caráter, personalidade e afetividade - foi embasado pelos exemplos dos pais e pelos valores repassados por seus avós. Ilda Maria Costa Brasil
Enviado por Ilda Maria Costa Brasil em 25/04/2013
Alterado em 09/01/2014 Copyright © 2013. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |