Ilda Maria Costa Brasil, Celeiro da Alma

"Sonhar é acordar-se para dentro." Mario Quintana

Textos



A BARATA
 
5ª Feira Santa, 15 horas... Não lhes temo, nem morro de amores por elas.
Encontrava-me numa agência bancária no centro de Porto Alegre, aguardando numa fila quilométrica, quando vi um funcionário se aproximar da garota que auxiliava os clientes nos caixas eletrônicos. Ele lhe sussurrou algumas palavras. Ela, imediatamente, virou-se e olhou na direção do elevador. Paralisei, pois imaginei que havia, no ambiente, alguém suspeito, um possível assaltante. Porém, ao olhar para o rosto da atendente, percebi um sorriso sarcástico e dissimulado. Virei-me e notei que, no vidro da divisória, caminhava, tranqüilamente, uma visitante indesejada e nada oportuna.
O rapaz, rapidamente, encaminhou-se ao corredor e, a alguns passos da enxerida turista, agachou-se, retirou o tênis do pé direito e, impetuosamente, atacou a sua vítima, a qual, zonza, tentou proteger-se. O garoto, na ânsia de livrar-se da bichinha e numa nova investida, desequilibrou-se um pouco. Refez-se logo e, com o tênis na mão direita, voltou a atacar a indefesa vítima que, embora ferida, defendeu-se do inimigo. O duelo HOMEM-BARATA esquentou: ele, atacava; ela, defendia-se. O seu ir e vir irritou o jovem funcionário o qual acreditava dar-lhe fim, sem ser notado por clientes.
A atrevida barata corria pelo vidro, balançando, descompassadamente, suas anteninhas, como a desafiar o agressor: “– Vem... vem...” Esse a olhou com desprezo e a atacou, outra vez, com mais força e agressividade.
O terceiro e último golpe a derrubou agonizante e, em segundos, começou a escorrer de seu corpo um líquido gosmento e esbranquiçado. Agressor, vítima e expectadores, silenciosos. De repente, passou-me um frio desconfortante e fiquei na espera do gesto final. O cruel agressor abaixa-se, pega o corpo estraçalhado, joga no lixo e, a seguir, retorna às suas atividades.
Faço meus pagamentos e me retiro pensando no quanto os homens têm sido cruéis com os seus semelhantes; logo, dar fim a um bichinho considerado uma praga, não provocaria em ninguém piedade, conflitos pessoais ou remorsos.

 
Ilda Maria Costa Brasil
Enviado por Ilda Maria Costa Brasil em 28/06/2010
Alterado em 09/01/2014
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